Marcus Vinícius D´Almeida, de apenas 15 anos, era o mais jovem entre os 145 arqueiros do Mundial adulto, eliminou favoritos e só perdeu para o atual campeão olímpico, acabou em 17º lugar e sonha alto. 12/11/2013 - O Globo - RJ (Esportes)
Na tarde de 2 de Outubro passado, Marcus Vinícius D´almeida puxou a corda de seu arco para a última flecha que dispararia no Mundial de Tiro com Arco adulto, em Belek Antalya, na Turquia. Atleta mais jovem da competição, com 15 anos, o brasileiro havia ido longe: havia passado em 32º lugar na fase de classificação disputada por 145 arqueiros de todo o mundo. Logo no primeiro combate venceu o polonês que o havia derrotado em sua primeira competição internacional dois meses antes; e disputava naquele momento, a flecha de morte contra um atleta de Bangladesh. Marcus Vinícius respirou fundo, soltou a corda e viu sua flecha acertar em cheio o centro alvo. - Os caras às vezes ficam falando que eu só tenho 15 anos. Nos combates mesmo, já entram falando isso. Os próprios treinadores dizem. Mas eu uso isso ao meu favor. Se eu meto a flecha boa, a pressão muda de lado, e o adversário fica pensando que vai perder pra um garoto de 15 anos - Pondera D´almeida - Tem a questão do jogo. No combate cada arqueiro atira 3 flechas no mesmo alvo. E eu atiro rápido, tem gente que demora mais. Então quando soa o apito, significa que temos 120 segundos pra atirar. Eu vou lá e disparo as minhas enquanto o adversário só deu um tiro. Aí ele fica pensando: "tenho que atirar duas flechas boas". É toda uma questão psicológica, é um jogo além do físico.
A estratégia deu certo até a 3ª rodada do Mundial da Turquia. Depois de vencer o atleta de Bangladesh, D´almeida enfrentou o o sul-coreano Oh Jin Hiek, que é ninguém menos que o atual campeão olímpico da modalidade. Na disputa das primeiras 3 flechas o brasileiro conseguiu um empate. Mas nas três fases seguintes não conseguiu superar o campeão e foi eliminado. Ainda assim terminou o campeonato em 17º. Foi o melhor resultado do Brasil. Seus companheiros Daniel Rezende Xavier e Marcos Bortoloto ficaram em 60º e 96º, respectivamente. No feminino Sarah Nikitin conquistou um 8º lugar histórico para o Brasil.
- O combate foi de igual pra igual. Todo arqueiro tem sangue na veia. Não tem isso só porque é campeão ou porque é coreano. Mas os coreanos são mesmo os favoritos no tiro com arco. É que nem o Brasil no futebol. Às vezes o cara nem atira muito, mas sabe, tem alguma coisa a mais. - Conforma-se o jovem.
Dias antes, em Setembro, D´almeida havia disputado o mundial de cadetes em Wuxi na China. Contra atletas de sua idade ficara em 9º lugar. - Na China eu passei em 33º lugar na classificação entre 110 arqueiros. Mas comecei muito mal. Eu esperava mais de mim. Atirei no alvo errado, acredita? Mas daí ganhei do primeiro e depois peguei um cara de Cingapura, depois um da Coréia, e em seguida um da Moldávia, que mesmo sendo cadete já tinha disputado as Olimpíadas de Londres. Ele era favorito mas eu genhei na flecha de morte. Então fui enfrentar o arqueiro de Taipei. Fomos para a flecha de morte de novo. Eu fiz um 9 e ele um 10 (centro do alvo). Perdi - diz.
Perdeu o combate mas saiu vencedor. O nono lugar deu a D´almeida a única vaga brasileira nos Jogos Olímpicos da Juventude, no ano que vem, em Nanquin na China. Este ano ele também conquistou o Campeonato Brasileiro de Cadetes, a Copa do Brasil e o Campeonato Indoor das Américas.
Mesmo tendo chegado ao Brasil na década de 1950, o tiro com arco ainda busca espaço no país. Há cerca de 2mil participantes em 80 clubes, segundo a Federação Brasileira de Tiro com Arco (CBTARCO), que tem sede em Maricá. Morador da cidade de interior do Rio de Janeiro, D´almeida começou a praticar depois de assistir a uma apresentação da modalidade na escola. Hoje é uma das estrelas do Arqueiros da Íris. - O esporte não é popular ainda. Se agente ganhar medalha nas olimpíadas vai ser uma bela maneira de divulgar. Aí vão começar a acreditar na gente - diz D´almeida, que para e pensa um pouco. - Não é que não acreditem agora, mas sabe... O basquete é divulgado porque ganhou medalhas, por exemplo.
Apesar de ter pouca idade D´almeida sabe que pode ter papel fundamental nesse caminho traçado para o sucesso do esporte. Sonha disputar os Jogos Olímpicis Rio-2016, quando terá 18 anos. Com poucas referências no próprio esporte é fã de Ayrton Senna, o ídolo que não teve tempo de conhecer. Ele se diz pronto para assumir a responsabilidade de popularizar o tiro com arco. - Isso dá igual. Meu treino tem que ser igula ao que é hoje. É só treinar. Não tenho outro caminho. - define.
A calma vem da influência de casa: - Ele conseguiu criar uma corrente muito legal em torno dele. Quando entrou na Seleção toda a família ficou feliz. Depois foram os colegas do colégio. Aí vieram os conhecidos de Maricá. De repente ele representou a cidade e virou o sobrinho, o amigo, o parente de todo mundo. Mas isso não é uma pressão sobre ele. Nós torcemos pelo ouro no Rio, imagina. Mas se não vier tem 2020, 2024... Ele é muito novo - diz a mãe, Denise Carvalho, que foi quem procurou a CBTARCO querendo informações para levar o filho a praticar o esporte.
2016 - RESPONSABILIDADE - Em 2016 quando jovens estarão enfrentando os desafios do vestibular e o ingresso em uma universidade, o arqueiro espera competir no Sambódromo, palco do tiro com arco nas Olimpíadas. - Eu falo que ele deve continuar os estudando até porque está conseguindo consciliar esporte e escola. Então vai fazer faculdade sim - afirma Denise, que se preocupou com o desempenho escolar do filho, depois que se mudou para Campinas, há um ano, para treinar com a seleção. - Eu chorava e ria ao mesmo tempo. Tinha o lado do orgulho misturado com a expectativa, porque ele só tinha 14 anos. Ficamos preocupados porque ele ia morar sozinho, não sabíamos como ia se virar pra comer, que roupa ia usar, se ia se dar bem no colégio, Mas ele amadureceu muito. Eu até brinco no trabalho que descobri que mãe atrapalha filho, porque ele melhorou em tudo. Enquanto tenta se adaptar à velocidade das mudanças na vida D´almeida lida com os desafios de compreender a rotina de vitórias e derrotas. - Sempre achei que tinha condição de vencer o sul-coreano. Acho que poderia ir melhor. Estava atirando muito bem. Mas nenhum arqueiro vai dizer que não pode ser melhor.